STJ: É possível inversão do ônus da prova em favor do MP em ACP consumerista

terça-feira, 1 de março de 2011

Quarta Turma
ACP. INVERSAO. ÔNUS. PROVA. MP.
Trata-se, na origem, de ação civil pública (ACP) interposta pelo MP a fim de pleitear que o banco seja condenado a não cobrar pelo serviço ou excluir o extrato consolidado que forneceu a todos os clientes sem prévia solicitação, devolvendo, em dobro, o que foi cobrado. A Turma entendeu que, na ACP com cunho consumerista, pode haver inversão do ônus da prova em favor do MP. Tal entendimento busca facilitar a defesa da coletividade de indivíduos que o CDC chamou de consumidores (art. 81 do referido código). O termo consumidor, previsto no art. do CDC, não pode ser entendido apenas como parte processual, mas sim como parte material da relação jurídica extraprocessual, ou seja, a parte envolvida na relação de direito material consumerista na verdade, o destinatário do propósito protetor da norma. REsp 951.785-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/2/2011. 


COMENTÁRIOS  DE Áurea Maria Ferraz de Sousa

A defesa coletiva de direitos é resultado da terceira geração dos direitos fundamentais. Está relacionada a determinado momento histórico, no qual se reconhece a existência de direitos que transcendem o indivíduo e que só podem ser exercitados de forma coletiva. Nesta categoria incluem-se direitos profissionais (sindicatos de trabalhadores, por exemplo), direitos ligados ao meio ambiente e, o que nos interessa para o comentário desta decisão, direitos do consumidor.
Assim, no plano infraconstitucional, o Código de Defesa do Consumidor desempenha papel fundamental na defesa dos direitos consumeristas e integra, juntamente com a Lei da Ação Civil Pública, aquilo que a doutrina denomina de microssistema processual coletivo. Isso porque a partir do seu artigo 81 está regulada a defesa do consumidor em juízo, mas as regras ali dispostas são aplicáveis a outras ações coletivas.
A ação civil pública para tutela de direitos do consumidor, portanto, é possível não só pela interpretação que se faz desse microssistema processual coletivo, mas principalmente porque a Lei Maior incumbe o Ministério Público de tutelar, por meio do inquérito civil e da ação civil pública, os interesses difusos e coletivos (art. 129, II, CF/88).
Pois bem. O presente julgado fixou entendimento sobre a possibilidade de se inverter o ônus da prova em favor do Ministério Público quando, em ação civil pública, seu representante estiver tutelando direitos do consumidor.
A inversão do ônus da prova é direito básico do consumidor, previsto no artigo , inciso VIII, do CDC, que assim preconiza:
Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
A inversão do ônus da prova, como direito do consumidor, é possível porque ele, diante do fornecedor (empresário) é presumivelmente considerado a parte hipossuficiente da relação, o que, em tese, não seria verdadeiro em se tratando da instituição do Ministério Público atuando em face do mesmo fornecedor de produtos ou serviços. Aliás, este foi o fundamento para que no TJ/RS o pedido do MP tenha sido indeferido:
(...) Juízo da 15ª Vara Cível da Comarca de Porto Alegre que, em ação civil pública, indeferiu a inversão do ônus da prova em favor do Parquet , ao argumento de que inexistiria hipossuficiência do órgão ministerial a justificar tal providência (...).
Relatório do julgado REsp 951.785-RS
Para o Tribunal da Cidadania, no entanto, este entendimento não é verdadeiro, razão pela qual, reconheceu ao parquet o mesmo direito (inverter o ônus da prova, atribuindo ao fornecedor a incumbência de provar o alegado) quando este atuar em defesa dos direitos do consumidor.
Nas palavras do relator, Min. Luis Felipe Salomão:
Não há óbice a que seja invertido o ônus da prova em ação coletiva - providência que, em realidade, beneficia a coletividade consumidora -, ainda que se cuide de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público.

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