Afogando a Amazônia

sábado, 3 de maio de 2014

Por Sérgio Leitão e Tica Minami 
Afogar a Amazônia
Diante da desastrosa gestão do setor elétrico que faz o Brasil enfrentar mais uma crise de fornecimento de energia, setores do governo e da indústria têm sugerido o retorno das hidrelétricas com grandes reservatórios. Estas seriam capazes de garantir mais energia e segurança para o país. Mas isso não passa de pura ilusão. Não é mais possível construir hidrelétricas com reservatórios na Amazônia devido a limitações técnicas e naturais. O próprio Ministério de Minas e Energia reconheceu que a ausência de quedas d’água forçaria o alagamento de imensas áreas. Isso sem contar o extenso histórico de falhas e erros que marcam o processo de licenciamento dessas grandes obras, com graves impactos socioambientais.
Historicamente, os direitos dos povos indígenas e ribeirinhos vem sendo desrespeitados. E hidrelétricas como as de Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira, foram construídas sem planos de contingência para lidar com cheias anormais que tendem a ser mais comuns com o agravamento das mudanças climáticas. O caso de Jirau é ainda mais complicado uma vez que deveria estar pronta em 2013 e cujo custo previsto em R$9 bi sairá por nada menos que R$17,4 bi e, talvez, comece a gerar energia em 2016. A ilusão se intensifica ao lembrarmos do anúncio da redução da conta de luz em 2012. O populismo tarifário praticado pela presidenta Dilma terá o efeito contrário e as tarifas de energia ficarão mais caras a partir de 2015. As distribuidoras, sufocadas diante do alto custo do acionamento das termelétricas, lidam com um rombo de R$12 bi que pesará no bolso dos consumidores. Claro, apenas após as eleições. Não há mágica que resolva as contas do governo e não há solução ‘simples’ como a das hidrelétricas com grandes reservatórios. Para alcançar uma matriz elétrica confiável e econômica, o país precisa de planejamento sério para diversificar suas fontes e assegurar o abastecimento de energia. É necessário investir em renováveis, como eólica e solar, que dispensam obras caras e demoradas e evitam custos com linhas de transmissão já que estão mais próximas aos centros consumidores. Em 2013, o valor mais alto para essas fontes foi de R$228/MWh para energia solar, ainda assim quase quatro vezes mais barata do que os R$822/ MWh alcançados em razão do acionamento das termelétricas. E a energia eólica contratou 4.700 MW no ano passado, valor capaz de atender quase 70% do que a matriz elétrica brasileira precisa crescer anualmente. Enquanto não houver planejamento nem diversificação do setor elétrico, o Brasil vai continuar patinando em busca de soluções não apenas caras a curto prazo, mas também tecnicamente inviáveis. Não será transformando a Amazônia em um imenso lago onde serão afogados todos aqueles que ousam mostrar caminhos novos para a condução do planejamento do setor elétrico que iremos resolver o problema.
Sérgio Leitão é diretor de políticas públicas do Greenpeace Brasil.
Tica Minami é coordenadora da campanha da Amazônia do Greenpeace Brasil

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